terça-feira, 25 de novembro de 2008

COMO TRANSFORMAR ELI WALLACH NA PERSONIFICAÇÃO DO FEIO

Ele poderia ser seu vizinho, o padeiro da esquina, seu tio, seu cunhado, até mesmo seu pai. No entanto, sem cicatrizes ou deformações aparentes, ele é o FEIO e Sergio Leone nos convence disso. É magistral a maneira como esse personagem é apresentado em sua primeira cena: como um monstro que se esconde em uma caverna e dela sai somente depois de ter “assustado” aqueles que vieram caçá-lo. Diferentemente, o MAU surge através de uma aproximação lenta, sem dissimulação. E o BOM, como um anjo da guarda, quase etéreo, aparece para proteger o “pobre FEIO”, mas também para fazer-lhe um contraponto, pois o BOM é Clint Eastwood, o BELO, que se fosse seu vizinho, o padeiro da esquina, seu cunhado ou o seu pai, você estaria perdidamente apaixonado(a). Assim, as crueldades cometidas pelo FEIO contra o BOM reforçam seus “títulos” já que elas podem ser claramente entendidas como inveja.

É evidente que alguns ângulos da câmera não favorecem Eli Wallach que colabora com algumas caretas na composição do seu personagem, o elemento feio na fotogenia geral. Aqui, o FEIO é MAU, como na cantiga popular levemente alterada “Boi, boi, boi... boi da cara feia pega este menino que tem medo de careta.”

Entretanto, sem muitos artifícios, é mesmo a comparação com o BELO que nos convence da “feiúra” de Tuco (Eli Wallach). Uma estratégia eficaz e recorrente no cinema. François Ozon se vale dela no filme 8 Mulheres, evidenciando-a através de um diálogo entre Catherine Deneuve e Isabelle Huppert no qual Gaby (Catherine Deneuve) diz à sua irmã Ausgustine (Isabelle Huppert): “Não tenho culpa se sou bela e rica enquanto você é feia e pobre.”Ora, se comparado à Clint Eastwood, Eli Wallach é o FEIO, por outro lado não seria difícil inverter sua posição se o comparamos com tantos monstrengos que já vimos nas telas.

A feiúra é, então, relativa e pode ser apenas uma máscara de proteção, como uma carranca na proa de um barco para afastar os maus espíritos. Diversas culturas praticam tal expediente. Mais uma vez, é a bela Catherine Deneuve que me vem à memória, quando no filme Indochina, interpretando Eliane, ela saúda o seu neto recém-nascido dizendo: “Como ele é feio!”, e acrescenta bem baixinho “É para protegê-lo dos maus espíritos, que viriam buscá-lo se descobrissem o quanto ele é belo”.

Então, chamem-me de O FEIO que também estarei protegido dos maus espíritos e quem sabe atrairei um anjo da guarda como Clint Eastwood, O BELO.

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